Para além da crise (Juarez de Paula)

9 de maio de 2009 at 15:48 Deixe um comentário

Por Juarez de Paula, abril de 2009

A crise atual evidencia, em escala global, uma contradição estrutural do padrão capitalista de produção e consumo: a reprodução ampliada do capital depende da existência de consumidores, mas o mercado, sem regulação social, tende a promover a concentração de riquezas, a exclusão social das maiorias e a degradação ambiental do planeta, a ponto de colocar em risco a própria existência da humanidade. Não há possibilidade de manutenção do crescimento econômico sem distribuição de renda, pois sem renda não há consumo, sem consumo não há produção, sem produção não há emprego e sem emprego não há renda. Portanto, parece óbvio que para sair da crise é preciso defender os empregos, a renda e o consumo.

O país possui reservas acumuladas de 200 bilhões de dólares, o que representa um fator de segurança, credibilidade e confiança para a atração de investimentos. Os bancos brasileiros ficaram a salvo da quebradeira internacional. A despeito de alguma retração no crédito, provocada, sobretudo, pela aversão ao risco, não há colapso financeiro. A existência de fortes bancos públicos, a exemplo do BNDES, do Banco do Brasil e da CAIXA, tem permitido ao Governo Federal a intensificação da oferta do crédito para setores estratégicos da economia.

O país conta também com um plano arrojado de investimentos em infra-estrutura, o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, que mantém as atividades do setor da construção civil, um importante mobilizador de força de trabalho de baixa qualificação. O programa habitacional de construção de 1 milhão de moradias populares, recentemente anunciado, também contribui no mesmo sentido.

Além disso, programas de distribuição e transferência direta de renda tais como o Bolsa Família e a Previdência Social, associados aos programas de fortalecimento da agricultura familiar tais como o PRONAF e o PAA – Programa de Aquisição de Alimentos, têm elevado a renda e a capacidade de consumo das classes C, D e E com fortes impactos na redução da pobreza e na expansão da classe média. Esse novo segmento de consumidores tem sido responsável pela manutenção de um mercado interno aquecido, o que constitui uma enorme vantagem comparativa e competitiva do Brasil no atual cenário internacional de recessão e desemprego.

Outro aspecto relevante é a ênfase em programas de desenvolvimento territorial com foco nas regiões menos dinâmicas do país, a exemplo do Programa de Desenvolvimento das Mesorregiões Diferenciadas – PROMESO, dos Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento – CONSAD’s e principalmente do Programa Territórios da Cidadania, que promovem a convergência de investimentos públicos, a reabilitação do planejamento estratégico e a inovação institucional, na medida em que reconhecem a necessidade de políticas públicas em várias escalas: nacional, regional, sub-regional e local.

Para sair da crise defendendo os empregos, a renda e o consumo no plano local, é necessário ousadia, criatividade e inovação. Agora que o cassino internacional fechou suas portas, é preciso fazer novas apostas.

É preciso apostar no experimentalismo local, ou seja, nos negócios que já estão dando certo, mas que precisam ser fortalecidos, apoiados, consolidados e ampliados. Isto também exige inovação institucional. Muitas das regras atuais são excludentes e funcionam como “barreiras de entrada” que impedem o empreendedorismo. Iniciativas como a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas e o Micro-Empreendedor Individual – MEI apontam na direção correta.

É fundamental apostar no consumo da nova classe média. Os “novos consumidores” demandam alimentos; itens de vestuário; serviços de educação, saúde, transporte e lazer; melhorias habitacionais; aquisição de bens duráveis, sobretudo bicicletas, motos, aparelhos eletro-eletrônicos e equipamentos da “linha-branca” (fogões, geladeiras, máquinas de lavar). Tudo isso gera oportunidades no mercado interno.

É importante apostar em formas alternativas de organização econômica e em práticas inovadoras de inclusão social, tais como os empreendimentos de economia solidária, o cooperativismo de crédito e de produção, o comércio justo, a difusão de tecnologias sociais.

É decisivo apostar em negócios inovadores focados na sustentabilidade ambiental, como a agricultura orgânica, os biocombustíveis e bioplásticos, a energia solar e eólica, dentre outros.

Finalmente, é imprescindível apostar nos pequenos negócios e no consumo de produtos locais, pois juntos têm a capacidade de promover o crescimento econômico com distribuição de renda e inclusão social, o melhor caminho para além da crise.

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